Criança: no
singular e no coletivo
Uma mudança importante na vida da criança de 0 a 6 anos é o
movimento de saída de seu mundo familiar para o mundo coletivo da creche. A
percepção desta coletividade tem dois lados: a perda da individualidade e
a possibilidade de interação com as outras crianças nos encontros do pátio, nas
refeições, nas brincadeiras, nos cantinho do faz de conta da sala, nas
atividades de arte…
Como a criança vive sua singularidade e o
coletivo?
Quando
a criança está em seu mundo particular, em um momento só seu de pesquisa, as
descobertas acontecem no campo da experimentação. Envolvida no seu fazer, a
criança está vivenciado a cada segundo o que surge à sua frente. Está imersa e
as ações trazem significados para ela. Como diz o pedagogo e filósofo espanhol
Jorge Larossa Bondia, significativo é o que fica gravado em nós, passa a fazer
parte de nós e só a experimentação possibilita isto. A construção de uma pessoa
vem da soma das pequenas experimentações, sendo as primeiras na educação
infantil.
Mas,
quando a criança interage com as outras, compartilhando suas criações e permite
criar junto, ela continua experimentando e conquista o sentimento de criação
coletiva. A partir da singularidade de cada um dos participantes nesta produção
está nascendo mais do que uma obra nova, está surgindo uma ação coletiva,
compartilhada por meio da socialização das singularidades.
Podemos
observar isso acontecer com mais clareza nos trabalhos de arte em grupo, seja
nos desenhos coletivos em superfície grande, numa ação de simbolização no
faz de conta, onde a maneira de ser de cada um se revela nos inúmeros traços e
cores utilizados, nos diversos movimentos do corpo, nas palavras e frases
acrescentas à história. Não importa se o resultado é bonito ou feio, certo ou
errado, mas sim a possibilidade de se expressar. Dentro do todo construído, cada
um foi um.
Mas a
coletividade também se revela em outros momentos com naturalidade.
Em
muitas situações a coletividade vai se revelando na preferência dos
agrupamentos sem a interferência do adulto. As afinidades vão surgindo. Quando
isto é permito, as crianças criam, entre elas, um mundo de cumplicidade, muitas
vezes distante do professor e não revelado a ele. O professor, no início do
ano, desconhecido aos olhos da criança, é alguém alto, que só dá instruções e
está a todo o momento mandando fazer algo. Esta postura não permite à
criança ser do jeito dela. O seu espaço e tempo individual ficam reduzidos. Ela
só passa a ter a oportunidade de “ser grande” e dona da situação quando está
entre as outras crianças, brincando, criando e fazendo suas produções.
Nesse movimento de individualidades e
coletividades, as crianças estão sempre fazendo pesquisas e descobertas novas?
Não.
Em geral suas ações não geram novas descobertas, são momentos de reprodução do
que elas aprenderam com os adultos, seja em casa, seja na creche, com todos os
profissionais que integram a equipe, do segurança à direção. Nas interações com
outras crianças, os pequenos buscam interpretar a cultura da qual fazem parte e
as outras culturas que observaram. Assim, as produções que partem dos próprios
contextos das crianças não são meras imitações, são reproduções de ações
vivenciadas “re-criadas” e “re-produzidas” dentro de cada maneira de ser, de
cada universo singular em consonância com o coletivo.




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